segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

"11/09 na Visão da Al Qaeda": o controle sobre o grupo

Ontem assisti a um documentário incrível sobre o 11 de setembro, chama-se: "11/09 na Visão da Al Qaeda". É interessante que ninguém nunca teve "a coragem" de ver a história pelo outro lado da moeda, digamos assim. É óbvio que a Al Qaeda teve os motivos dela para agir dessa maneira, mas não é nesse aspecto que quero falar desse documentário aqui.
Conforme eu estava assistindo, algumas coisas (um tanto óbvias, confesso) me chamaram atenção: a primeira é que o controle religioso é extremamente rígido. Claro que todos devem saber disso, mas eu realmente fiquei impressionado com a capacidade que uma religião consegue controlar o homem. Obviamente que tal controle só existe porque o grupo controlado valoriza a Agência Controladora, como diz Skinner (1979).
Outro ponto que me chama atenção é a "inteligência" de Osama bin Laden. Ele realmente sabia como exercer o controle sobre aqueles que o seguia. Havia treinamentos para sequestro de aviões e era durante esses treinamentos que os sequestradores que mais se destacavam eram selecionados. No entanto, o sujeito selecionado tinha um perfil ideal: uma pessoa valente, no entanto calma e prudente, com total disposição de morrer como mártir pelos propósitos de Alá. E Osama sempre os reforçava, havia destaque dos futuros mártires perante o grupo. 
 Os propósitos de Alá, ao meu ver, eram os propósitos do próprio Osama bin Laden, no entanto, ele e o grupo realmente acreditavam no que os guiava: Alá queria a destruição dos Estados Unidos da América. Não era de uma pessoa, era toda a nação. É como se o território onde os EUA é situado fosse maldito ou algo do gênero. E seus seguidores estavam prontos para matar e morrer pela causa no momento em que ele desse "a ordem".
Para termos uma noção do controle exercido, a Al Qaeda matou o maior inimigo do Talibã simplesmente para que ele apoiasse os "propósitos de Alá". Esforços não eram medidos para conseguir o que queriam. Inclusive, o projeto original era de explodir várioas aviões, ao mesmo tempo, em diferentes partes do mundo, para que o terror sobre os homens fosse maior. Contudo, bin Laden achou que o plano era pretensioso demais e resolveu fazer só dos EUA o alvo principal.
Osama sabia exatamente como agir para conseguir que seus objetivos religiosos fossem alcançados. Sabia como reforçar negativa e positivamente aqueles que o seguiam. Seus seguidores morreriam por ele e "pela grande causa" sem pestanejar. E bin Laden queria que eles morressem por isso. O interessante é que ele reforçava positivamente aqueles que se propunham a isso, mas jamais faria pessoalmente o que planejava.
Osama bin Laden era um psicopata, simplesmente. E a Al Qaeda estava cheia de psicopatas também. Um exemplo é o seguidor de bin Laden que aparece dando depoimentos no vídeo (reparem na taça que tem ao lado dele. Torço para que seja vinho, porque se for coca-cola é realmente muito irônico) e outro exemplo é o biólogo da Malásia que só trabalhava com anthrax. A maioria das pessoas entrevistadas relatam que comemoraram e sentiram imensa felicidade quando as torres gêmeas foram atacadas. O controle era exercido também pela televisão, todos os mártires foram homenageados na TV com montagens representando o paraíso em que eles estavam depois que morreram.
As conclusões que cheguei depois de ver tal documentário é de que tanto a Al Qaeda como os EUA esqueceram dos seres humanos. A Al Qaeda porque queria o extermínio inconsequente de uma nação e os EUA por querer responder à altura, como se pode ver nos poucos depoimentos do Bush que aparecem no vídeo. 
Osama bin Laden me remeteu a Hitler. Ambos "inteligentíssimos", que acreditavam no que queriam e que conseguiam exercer um controle quase que sobre-humano nos grupos que os seguiam. No entanto, não enxergavam a crueldade de seus atos. Um por uma purificação do mundo e o outro por Deus.

Assistam ao documentário, realmente vale a pena:



A referência de Skinner, 1979, usada no texto é o livro Ciência e Comportamento Humano (Ed. Martins Fontes).

Indicações de leitura: capítulos XXII até o fim do livro deste citado acima, com atenção ao capítulo XXIII que fala sobre controle religioso e o livro Coerção e Suas Implicações do Murray Sidman (Ed. Livro Pleno).

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Espiritualidade: inata ou aprendida?

Na disciplina de Teoria Psicoterapêutica de Orientação Fenomenológica e Existencial estamos vendo um tema um tanto quanto polêmico: a espiritualidade. Justamente por estarmos estudando sobre o Viktor Frankl. É interessante, porque eu e um amigo (cognitivista) estávamos discutindo o tema, no sentido de ela ser inata ou não.
Segundo o que aprendemos em aula, espiritualidade "é uma dimensão, exclusiva do ser humano, por causa de sua consciência, que o permite transcender. A capacidade de transcender faz com que ele veja sua vida como algo maior".
Além disso, foi feita a afirmação de que a essa capacidade de transcendência do homem é o que faz ele aprender com a vida, faça com que a vida tenha um sentido, de modo que, anteriormente, o homem era visto como um ser biopsicosocial. E hoje, é visto como um ser "biopsicosócio-espiritual".
Durante a aula, foi concluído que a espiritualidade é inata, mas não é todo mundo que a "desenvolve", sendo que, os modos de desenvolver a espiritualidade ou vivê-la e experienciá-la é através da religiosidade, da meditação, entre outros métodos.

Minhas objeções a essa aula são as seguintes: primeiro considero que a espiritualidade é um comportamento aprendido. Ela não é inata. Para ser inata ela teria que demonstrar algum sentido de sobrevivência para toda a espécie humana e também teria de ter existido um "grau menor" de espiritualidade em nossos antecessores na escala evolutiva¹. A espiritualidade é ensinada desde quando você é criança pela comunidade verbal, pelas agências controladoras como a religião, a educação (em aulas de ensino religioso, por exemplo) e pela família (quando esta tem uma crença religiosa/mística), embora a própria espiritualidade não deva ser confundida com a religião em si.
Outro ponto que gera incômodo, pelo menos a mim, é de que a espiritualidade seria exclusiva ao homem. Deste modo, podemos entender que a espiritualidade só nasceu depois que o primeiro Homo sapiens surgiu. O que contradiz a ideia de inatismo proposta em sala de aula, visto que precisaria de um certo tipo de espiritualidade em hominídeos que antecederam a raça humana. A espiritualidade não é um comportamento determinado filogeneticamente no sentido estrito da palavra. É mais um comportamento mediado socialmente através da cultura de uma determinada sociedade do que por seleção natural.
Além disso, até que ponto pode-se dizer que uma pessoa é espiritualizada nesse sentido? Eu, particularmente, concluí que não tenho espiritualidade depois que assisti a essa aula. E os psicólogos existenciais-humanistas discordariam disso, pois, a espiritualidade existe em mim mesmo que eu não a desenvolva. 
Isso também me gera um certo desconforto, teoricamente falando, porque se eu não tiver espiritualidade, possivelmente não conseguirei "aprender com a vida". Mas o que seria aprender com a vida, primeiro de tudo? Creio que seria nada mais do que ir vivendo, operando sobre o meio e sendo operado por ele, discriminando, através de processos comportamentais, o que seria "certo" e "errado", tendo o reforçamento e a punição de comportamentos assertivos ou desadaptativos advindos da comunidade em que vivemos; aprender com a vida também seria aprender socialmente (através de modelação, por exemplo), sempre sofrendo as consequências de seus atos contingencialmente ao comportamento apresentado.
Também não concordo que para ter um sentido na vida seja estritamente necessário ter espiritualidade. Não creio que um dependa do outro. O sentido de vida, até para os psicólogos existenciais-humanistas, não é algo imutável. Dessa maneira, o sentido que você dá a sua vida depende das variáveis que envolvem as contingências de reforçamento da qual seu comportamento é função.
Um exemplo que pode ser dado vem de pessoas que vivenciam grandes desastres. Alguém que passa por uma situação traumática muito grave, onde correu risco de vida, pode dizer que "algo mudou dentro dela" e que, agora, ela vê sua vida, o mundo e a vida das pessoas à sua volta de outra maneira. Diriam que ela mudou seu sentido de vida. Eu concordo em parte: ela pode ter realmente mudado seu "sentido de vida", mas não por que sua consciência a fez transcender do mundo real para um mundo onde ela entendesse a "verdade das coisas", mas porque viveu contingências extremamente aversivas que a fizeram entender que sua vida é frágil e pode acabar num determinado tipo de acidente, mesmo que ela não o tenha causado. E essa discriminação ocorre independentemente de uma espiritualidade ou até mesmo da própria consciência enquanto entidade mental. Qualquer pessoa que corre risco de vida (R-) pode ter uma tendência a mudar determinados comportamentos para que não mais esteja "a mercê" de uma situação tão perigosa.

¹ Para melhor compreensão dessa passagem do texto, ler o capítulo 3 do livro: CATANIA, A. C. Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. Porto Alegre: Artmed, 1999.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Duas críticas ao Behaviorismo

Que críticas são feitas ao Behaviorismo não é nenhuma novidade. O próprio Skinner lista 20 críticas bastante recorrentes em seu livro de 1974, About Behaviorism (Sobre o Behaviorismo, Ed. Cultrix, no Brasil). Entretanto, há alguns dias li certas críticas no Facebook que me incomodaram. Uma delas é a de que, como nós behavioristas "não aceitamos a mente, mas aceitamos os sentimentos?". 
A resposta: Essa crítica me parece um tanto ignorante (para não dizer burra, desculpem o termo). Alguém que nos joga esse tipo de crítica claramente não compreende o que entendemos por mente e muito menos o que entendemos por sentimentos. Creio que, quando dizemos que não aceitamos a concepção de mente, dizemos que não aceitamos os conceitos que vem da luz de abordagens como a psicanálise, por exemplo. Isto é, não admitimos que comportamentos são causados por instâncias mentais como àquelas que Freud chamou de 1ª e 2ª Tópicas. 
Skinner diz que todo comportamento começa inconsciente, mas no sentido de não sabermos quais são as variáveis das quais nosso comportamento é uma função. É algo muito diferente de dizer que agimos inconscientemente porque uma entidade que habita nosso organismo não nos deixa ter acesso concreto às causas do nosso comportamento.
Essa concepção é dualista, ou seja, admite o paradigma mente-corpo para explicar o comportamento humano. E, como sabemos, o Behaviorismo é monista. Consideramos "mente" nada mais que um tato para designar uma série de comportamentos encobertos (percepção, cognição, etc), ou seja, comportamentos que ocorrem dentro de nossa pele, que difere de comportamentos abertos tão-somente pela acessibilidade.
Já sobre sentimentos: o que são sentimentos e emoções além de respostas fisiológicas ante estímulos proveninentes do ambiente ou de alterações do ambiente? Óbvio que quando falamos de sentimentos, a discussão torna-se um pouco mais complicada do que se falássemos somente de emoções. No entanto, o princípio é o mesmo: uma alteração no meio gera uma alteração no organismo e o que sentimos nada mais é do que um comportamento encoberto, assim como aqueles que o termo "mente" designa.
O sentimento, assim como a "mente", não é causa do comportamento, pois é um subproduto das contingências de reforçamento que o sujeito vive. Como disse: os comportamentos encobertos diferem dos comportamentos abertos tão-somente pela acessibilidade. O que causa ambos são as variáveis ambientais das quais o sujeito está passível de sofrer influência.

A outra crítica que me deixou incomodado foi a de que o que nós fazemos nada mais é que reduzir "o ser humano a um conjunto de comportamentos" e que isso é insatisfatório e, por isso, somos pretensiosos.
A resposta: Acusar-nos de sermos reducionistas é uma das críticas mais manjadas que existem. Só faltou o "são mecanicistas" para estar formada a duplinha dinâmica das críticas ao Behaviorismo. Nem vou me estender tanto para responder a essa crítica aqui no blog. 
Dizer que meramente reduzimos o ser humano a comportamentos é simplesmente não saber o que significa comportar-se. A impressão que eu tive é a de que o Behaviorismo RADICAL é ainda muito confundido com o Behaviorismo METODOLÓGICO. Comportar-se não é ser um robô "bate e volta" de estímulos do meio. Vai muito além disso. Comportar-se é interagir com o meio, modificá-lo, ser modificado por ele, é perceber, sentir e abstrair coisas, é entender o outro e se entender. É se autoconhecer e saber responder ao meio no qual se está inserido. Como disse, não acho que essa crítica mereça atenção. É uma crítica que simplesmente evanescer-se-ia se aqueles que a usam estudassem mais.
E, por isso, aconselho as seguintes leituras: o Sobre o Behaviorismo (Ed. Cultrix), que é um livro pequeno e gostoso de ler, os dois últimos capítulos, 8 e 9, do livro Contingencies Of Reinforcement: A theoretical analysis (Ed. Appleton-Century-Crofts), e o capítulo 1 do livro Questões Recentes na Análise Comportamental (Ed. Papirus). Todos três livros são do Skinner. Nada melhor que beber da fonte para entender fidedignamente o que o Behaviorismo Radical entende por "mente", sentimentos e comportamento.